Por: Dra. Patrícia Marinho Costa de Oliveira?O HIV e os vírus das hepatites B (VHB) e C (VHC), causadores de hepatite crônica, cirrose e câncer de fígado, têm modos de transmissão semelhantes. O VHB pode ser transmitido por via sexual, por contato com sangue ou secreções contaminadas ou, ainda, da mãe para o filho durante a gestação e o parto. O contágio pelo VHC se dá predominantemente através de sangue contaminado, como ocorre com indivíduos que receberam transfusões antes de 1992 e com usuários de drogas injetáveis – as quais, aliás, são vias de transmissão comuns ao HIV.
Dessa forma, não é incomum que portadores do HIV estejam também infectados pelo VHB e pelo VHC. De fato, a prevalência de infecção pelo VHB em pacientes HIV-positivos é da ordem de 10% a 15%; já o VHC está presente em 6% a 13% desses indivíduos. O vírus da hepatite A (VHA) não é causa de hepatite crônica. Entretanto, na população portadora de HIV, esse agente é de particular importância entre os homens que fazem sexo com homens (HSH), pois práticas sexuais com intercurso anal favorecem a transmissão de tal vírus.
Assim, o rastreamento de coinfecções em pacientes infectados pelo HIV deve compreender a pesquisa dos vírus das hepatites A, B e C, realizada por meio de testes sorológicos e/ou da pesquisa do material genético (RNA ou DNA) desses agentes. Em indivíduos cujos exames não evidenciam a presença de infecção atual ou pregressa pelo VHA e pelo VHB, a imunização está indicada. É importante lembrar que outras medidas simples de prevenção, como o uso de preservativos e o não compartilhamento de agulhas e seringas, são também importantíssimas para evitar a infecção não somente pelo HIV, mas também pelo VHB e pelo VHC.
As infecções crônicas, tanto pelo HIV quanto pelos vírus das hepatites B e C, podem ser tratadas. Existem várias drogas antirretrovirais desenvolvidas para o tratamento do HIV que mudaram drasticamente a evolução da aids. Há também diversos medicamentos para tratar a hepatite B (interferon, antivirais) e a hepatite C (interferon e ribavirina). Com o advento da terapia antirretroviral (Tarv), a mortalidade relacionada à aids diminuiu, de modo que as doenças hepáticas passaram a ser importante causa de mortalidade nos indivíduos coinfectados pelo VHB e pelo VHC, reforçando a necessidade de tratamento dessas infecções também em tal grupo de pacientes.
Pacientes coinfectados por HIV-VHB apresentam evolução mais rápida da doença hepática, maior chance de progressão para a cirrose, maiores taxas de replicação do VHB – que é avaliada por meio da detecção quantitativa do VHB-DNA por PCR – e risco aumentado de mortalidade causada por doenças hepáticas. Em pacientes não portadores do HIV e com imunidade normal, cerca de 90% a 95% das hepatites B agudas evoluem espontaneamente para a cura. Já em pacientes infectados por HIV, essa evolução favorável ocorre em 60% a 80% dos casos.
O tratamento da hepatite B crônica pode estar indicado em pacientes coinfectados pelo HIV, especialmente se houver inflamação e/ou fibrose no material obtido por biópsia hepática, além de níveis elevados de replicação viral. Entretanto, as chances de resposta à terapêutica são menores nessa população, quando comparadas às dos indivíduos HIV-negativos. Em geral, os pacientes com contagem de células CD4 mais elevada – ou seja, com imunidade menos comprometida – respondem melhor ao tratamento.
Já a coinfecção por HIV-VHC é mais prevalente em usuários de drogas intravenosas e indivíduos politransfundidos, a exemplo dos hemofílicos. A hepatite C não é considerada uma doença sexualmente transmissível, mas, em pacientes infectados pelo HIV, a chance de transmissão sexual do vírus C da hepatite é bem mais alta do que na população geral, especialmente no subgrupo dos HSH. Em indivíduos coinfectados por HIV-VHC, a evolução de ambas as doenças tende a ser mais rápida, bem como a velocidade de progressão para cirrose.
O tratamento da hepatite C está indicado quando o paciente tem melhores condições de resposta, ou seja, quando não há replicação do HIV, documentada por carga viral indetectável, e a contagem de linfócitos T CD4 é de, pelo menos, 350 células/mm3. As drogas de escolha são as mesmas utilizadas em pacientes HIV-negativos (interferon e ribavirina), mas é preciso estar atento a possíveis interações medicamentosas com a Tarv. Da mesma forma que em indivíduos coinfectados pelo VHB, a chance de resposta ao tratamento é menor em pacientes coinfectados por HIV-VHC. Mais recentemente, inibidores de protease com ação sobre o VHC, como boceprevir e teleprevir, foram aprovados para o tratamento da hepatite C crônica em monoinfectados virgens de tratamento ou com falha prévia ao esquema terapêutico convencional, com resposta superior, o que, em breve, deve se estender aos coinfectados.
Fonte: http://www.fleury.com.br/
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