Doença inflamatória intestinal

Por: Dr. Roberto Blasbalg, Dr. Rogerio Pedreschi Caldana, Dra. Maria Lucia Ferraz
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O caso refere-se a um paciente do sexo masculino, de 61 anos, que apresenta queixa de diarréia e perda de peso. Nesta faixa etária, a principal preocupação é a de se afastar o diagnóstico de neoplasia intestinal, o que pôde ser feito por meio da colonoscopia e do trânsito intestinal normais. Outros diagnósticos a serem considerados seriam as doenças inflamatórias, sobretudo as que afetam o íleo terminal (uma vez que o colonoscopia foi normal), os quadros isquêmicos e a diarréia funcional da síndrome do intestino irritável. Neste caso, a ausência de dor abdominal torna menos provável o diagnóstico de isquemia e a perda ponderal aponta para um quadro orgânico e não funcional.

Dentre os quadros inflamatórios crônicos que afetam a porção terminal do íleo, devem ser considerados sobretudo os diagnósticos de Doença de Crohn e de tuberculose intestinal, além dos linfomas de intestino. Como parte da propedêutica de investigação do quadro de emagrecimento e diarréia, e em virtude destas hipóteses diagnósticas levantadas, o paciente realizou tomografia de abdômen. O aspecto tomográfico foi sugestivo de doença de Crohn, tendo em vista os achados comentados a seguir:

1. Padrão de espessamento parietal do íleo

O padrão do espessamento parietal é um importante fator na distinção entre processo benignos e malignos. Espessamentos simétricos têm maior probabilidade de corresponderem a alterações inflamatórias ou vasculares. Espessamentos assimétricos, irregulares ou associados a componente expansivo (intraluminal ou exofítico) geralmente correspondem a lesões neoplásicas, benignas ou malignas.

O grau de espessamento também é um fator propedêutico importante: espessamentos menores que 2,0 cm sugerem alterações benignas, enquanto espessamentos superiores a 3,0 cm são indicadores que sugerem malignidade.

Finalmente, a manutenção do padrão estratificado das camadas da parede intestinal, observada na fase contrastada do exame, exclui a possibilidade de processo maligno, constituindo um dos principais, senão o mais importante, indicador de benignidade. O adenocarcinoma do íleo distal, por exemplo, apresenta-se primariamente como lesão anular constritiva, envolvendo um pequeno segmento intestinal. Seu aspecto excêntrico ou irregular pode não ser evidente, porém a estratificação da parede deve estar caracteristicamente comprometida.

Ao observarmos o caso em questão, o espessamento ileal é menor que 2,0 cm, de aspecto segmentar e simétrico, mantendo a estratificação da parede intestinal, com proeminente realce da camada interna da parede (mucosa), e delimitando um pequeno halo externo de menor atenuação. Este aspecto é observado principalmente em processos inflamatórios, podendo também ocorrer na isquemia intestinal.

2. Aspecto morfológico dos demais componentes da região ileocecal

Algumas alterações patológicas da região ileocecal têm propensão ao comprometimento de mais de uma de suas estruturas anatômicas (ceco, apêndice, íleo terminal e válvula ileocecal), o que pode ser útil na caracterização do processo.

3. Pesquisa de possíveis achados associados

Alterações secundárias ou associadas ao espessamento intestinal podem estar presentes, como sinais de obstrução intestinal, linfonodomegalias, densificação ou estriações da gordura perivisceral, proliferação fibrogordurosa, coleções líquidas ou imagens gasosas extraluminares (indicativas de perfuração).

Achados como estes são fundamentais para a suspeita de algumas etiologias, como a tuberculose intestinal, caracterizada por lesão parietal assimétrica (geralmente na válvula ileocecal ou parede medial do ceco), ulcerada ou não, associada a linfonodomegalias regionais com característica hipoatenuação central.

Densificações ou estriações da gordura perivisceral são indicativas de extensão do processo além da camada serosa. Na maioria dos casos, este achado representa processo inflamatório agudo, porém em neoplasias malignas pode corresponder a infiltração loco-regional. A densificação intensa da gordura mesenterial, em grau desproporcional ao espessamento intestinal, constitui um forte indicador de processo inflamatório agudo, como observado em casos de diverticulite, apendicite ou apendagite. Densificações da gordura também podem estar presentes nas lesões actínicas, geralmente associadas a alterações dos demais órgãos da região, como espessamento das paredes retais e vesicais.

A proliferação gordurosa do mesentério, presente neste caso, é um sinal indicativo de processo inflamatório crônico regional, sendo particularmente freqüente na Doença de Crohn. Em casos acentuados, pode determinar o afastamento do espaço entre as alças delgadas, outro aspecto característico da doença.

No caso descrito, há espessamento simétrico de um segmento distal do íleo, com manutenção da estratificação parietal, proliferação dos planos gordurosos adjacentes, sem coleções líquidas ou linfonodomegalias associadas.

Este aspecto tomográfico demonstra características de um processo inflamatório crônico ileal, que associado aos dados clínicos colocam a Doença de Crohn como principal hipótese diagnóstica.



Figura 1: Sinal do "halo gorduroso" no hilo terminal. Caso ilustrativo demonstrando outro achado tomográfico típico da Doença de Crohn, que consiste na proliferação de tecido gorduroso na submucosa do segmento de alça comprometido. Este aspecto é indicativo de processo inflamatório crônico intestinal, em período fora de atividade.

Fonte: http://www.fleury.com.br/

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